O que dispõe a Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025?
- Carlos Sergio Gurgel

- 16 de set.
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O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aprovou por unanimidade, durante sua 147ª reunião ordinária realizada em 3 de setembro de 2025, a Resolução nº 510, que estabelece diretrizes técnicas e requisitos de validade para a emissão de Autorizações de Supressão de Vegetação (ASV) nativa em imóveis rurais. A norma busca garantir maior transparência, integração e ampla divulgação dessas autorizações, aplicando-se a todas as ASVs, independentemente das nomenclaturas utilizadas pelos diferentes órgãos ambientais[1].
Conforme destacado pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), a emissão das ASVs deverá ocorrer por meio do Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor) ou por sistemas estaduais integrados. A Resolução atende determinações do Supremo Tribunal Federal, proferidas nas ADPFs 760 e 743, e impõe ainda a disponibilização de todas as autorizações concedidas nos últimos cinco anos. A CNM ressalta que os municípios somente poderão emitir ASVs nos casos em que detenham competência para o licenciamento ambiental ou por delegação formal do Estado, sendo essencial que os gestores municipais se preparem para as adaptações exigidas, considerando que a norma entra em vigor em 180 dias[2].
O que representa, na prática, as disposições dessa nova Resolução CONAMA? No que tange à gestão do patrimônio florestal brasileiro, representa um avanço normativo significativo no ordenamento jurídico ambiental brasileiro, ao estabelecer critérios técnicos, condições de validade, requisitos de transparência ativa e integração de sistemas para a emissão de Autorizações de Supressão de Vegetação (ASV) nativa em imóveis rurais. Trata-se de uma resposta institucional às recorrentes fragilidades observadas no controle da conversão de cobertura vegetal nativa no território nacional, especialmente em um contexto de elevada pressão por expansão agropecuária e recorrentes denúncias de uso indevido de autorizações para finalidades distintas das legalmente previstas.
Tais atividades agropecuárias são, por óbvio, fundamentais para a segurança alimentar pátria e para o fortalecimento da economia nacional. No entanto, não convém que tais atividades ocorram ao arrepio da legislação aplicável. Desta forma, quanto mais geoinformações qualificadas se dispuser, mais os órgãos de controle e fiscalização ambiental, bem como os profissionais que assessoram a atividade empresarial e a população em geral disporão de informações aptas a gerar ações assertivas na defesa do patrimônio florestal pátrio, que nas áreas de usos permitidos, precisam ser utilizadas de forma racional e, portanto, sustentável.
A Resolução tem como eixo estruturante a vinculação da emissão das ASVs à regularidade ambiental do imóvel rural, com base nas informações constantes no Cadastro Ambiental Rural (CAR). De acordo com o art. 4º da norma, a ASV somente poderá ser emitida se o imóvel estiver com a inscrição no CAR ativa (inciso I), sem pendências administrativas (inciso II), com a reserva legal aprovada (inciso III), com as áreas rurais consolidadas confirmadas, quando aplicável (inciso IV), e após análise técnica pelo órgão ambiental competente (inciso V). Essa exigência eleva o grau de responsabilidade institucional no processo autorizativo e contribui para coibir supressões fundadas em registros inconsistentes ou fraudulentos[3].
Outro aspecto relevante da Resolução refere-se à determinação de ampla publicidade das autorizações concedidas. O art. 6º obriga a disponibilização das ASVs e das manifestações técnicas que as fundamentam em sistema de acesso público, enquanto o art. 7º, §§ 1º a 3º impõe a publicação imediata dos dados das autorizações em formato de planilha digital e arquivo vetorial georreferenciado, contendo informações como localização, tipo de vegetação, área de supressão, e identificação do órgão emissor. A norma consagra, assim, o princípio da transparência ativa, na medida em que impõe a divulgação automática e sem necessidade de provocação externa, o que viabiliza o controle social e institucional[4].
A integração entre sistemas estaduais e o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), sob coordenação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), constitui outro pilar da nova normatização. O art. 8º da Resolução determina que todas as ASVs sejam emitidas por meio do Sinaflor ou por sistemas estaduais que estejam permanentemente integrados a ele. Além disso, os §§ 3º e 4º do mesmo artigo estabelecem que o Ibama deverá disponibilizar um sistema padronizado e seguro que permita o intercâmbio de informações, enquanto os estados devem adequar seus sistemas à API do Sinaflor, garantindo sincronização plena com a base federal[5].
Não menos importante é a previsão de limites temporais à validade das ASVs. O art. 4º, § 4º, determina que a autorização terá validade máxima de doze meses, prorrogáveis uma única vez por igual período. Quando vinculadas a empreendimentos sujeitos a licenciamento ambiental com Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), a validade da ASV deverá acompanhar o cronograma de implantação aprovado, conforme disposto no § 5º do mesmo artigo, sendo vedada sua prorrogação além da vigência da licença ambiental correspondente. Essa vinculação temporal evita o uso indevido de autorizações fora de contexto e impõe maior coerência entre os instrumentos da política ambiental[6].
Do ponto de vista federativo, a norma reconhece a possibilidade de emissão de ASV por órgãos municipais ou consórcios públicos intermunicipais, desde que preenchidos requisitos técnicos e institucionais específicos. O art. 9º, caput, estabelece que isso só será possível quando os municípios forem os competentes para o licenciamento ambiental da atividade ou quando houver delegação formal do estado, nos termos do art. 10. Além disso, os incisos do art. 9º exigem estrutura técnica qualificada, conselho municipal de meio ambiente atuante e disponibilização das autorizações no Sinaflor e em portal público. Essa disposição é compatível com o modelo de gestão compartilhada previsto na Lei Complementar nº 140/2011, mas impõe critérios rígidos para evitar delegações indevidas em contextos de baixa capacidade local[7].
Por força dessa alteração, no caso do conceito (uma vez que nem projeto ainda existe) do Parque Linear no Município de Natal/RN (localizado às margens de trecho da avenida Engenheiro Roberto Freire), caberia ao órgão ambiental municipal, no caso a SEMURB, promover a apreciação e a eventual emissão de ASV para supressão de vegetação nos trechos indicados no futuro projeto de instalação do parque, uma vez que neste caso: a) há órgão ambiental com capacidade técnica comprovada (inciso I do art. 9º); b) há ainda conselho municipal de meio ambiente ou colegiado equivalente com competência deliberativa e de controle social ambiental ativo (inciso II do art. 9º), bem como; c) há a possibilidade de disponibilização do ato autorizativo no Sinaflor e em portal de dados abertos ou sítio eletrônico oficial (inciso III do art. 9º)[8].
Ainda que a Resolução represente um significativo avanço, é preciso reconhecer que sua efetividade depende diretamente da capacidade de implementação pelos entes federativos. Muitos estados e municípios ainda não dispõem de sistemas informatizados integrados ao Sinaflor ou de equipes técnicas suficientes para cumprir os novos requisitos. A exigência de georreferenciamento preciso (art. 5º, inciso XII), análise prévia do CAR e publicação em formatos abertos pode se revelar desafiadora em unidades da federação com deficit estrutural, o que impõe a necessidade de apoio técnico e financeiro, especialmente por parte da União. Caso contrário, o que seria um instrumento de controle, monitoramento e fiscalização saudável, pode ser tornar um entrave desnecessário e desproporcional, capaz de causar grandes prejuízos para as atividades econômicas, mesmo aquelas sustentáveis por natureza[9].
Outro aspecto relevante da Resolução refere-se à disciplina da “limpeza de áreas em pousio”, conforme previsto no art. 3º. A norma corretamente reconhece que o uso alternativo do solo em áreas anteriormente utilizadas, cujo uso tenha sido interrompido por até cinco anos, não deve, em determinadas circunstâncias, depender de nova autorização de supressão, desde que respeitadas as restrições legais. Essa desburocratização é positiva, especialmente para assegurar a continuidade de atividades produtivas de baixo impacto. Contudo, a ausência de uma estrutura estatal eficiente de fiscalização pode comprometer a adequada verificação da veracidade das declarações exigidas, convertendo uma medida razoável em uma potencial fragilidade institucional. Cabe ao Estado, portanto, garantir que essa exceção seja devidamente acompanhada de mecanismos de controle técnico e auditoria permanente, a fim de assegurar que o princípio do uso sustentável dos espaços seja efetivamente respeitado[10].
De igual modo, o art. 4º, § 3º, admite que a ASV possa ser emitida, em caráter excepcional, antes da conclusão da análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR), desde que exista manifestação técnica fundamentada assinada por profissional habilitado. Tal previsão, em si, é compatível com a busca por eficiência administrativa e respeito aos direitos dos produtores que atuam com responsabilidade ambiental[11].
No entanto, a ausência de critérios padronizados para a validação posterior dessa análise técnica, aliada à morosidade dos órgãos públicos em regularizar o passivo de cadastros, expõe os particulares a inseguranças jurídicas e pode conduzir a interpretações díspares. É imprescindível que o Estado assegure os meios técnicos, humanos e orçamentários necessários para que tais excepcionalidades não se transformem em regra informal, comprometendo a integridade do sistema ambiental.
Adicionalmente, o art. 11 confere aos órgãos ambientais competência para exigir critérios adicionais e medidas compensatórias relativas à supressão de vegetação nativa. Embora essa faculdade amplie a margem de atuação administrativa, a ausência de parâmetros mínimos e diretrizes nacionais unificadas pode resultar em interpretações divergentes entre os entes federativos, gerando assimetrias na aplicação da norma e instabilidade para os empreendedores que buscam atuar dentro da legalidade. O uso sustentável dos espaços exige previsibilidade e segurança jurídica, de modo que é dever do Estado estabelecer, de forma clara, os limites e possibilidades dessas exigências, evitando que obrigações excessivamente discricionárias desestimulem boas práticas ambientais[12].
Em conclusão, entendemos que a Resolução CONAMA nº 510/2025 representa um avanço relevante ao reforçar o papel regulador do Estado na gestão ambiental, promovendo maior padronização, transparência e controle sobre a emissão de autorizações de supressão de vegetação. Contudo, sua efetividade dependerá da atuação diligente e proativa da administração pública em garantir a infraestrutura necessária para sua aplicação uniforme.
Sem esse comprometimento institucional, há risco de que medidas tecnicamente bem formuladas sejam fragilizadas pela omissão estatal, frustrando os objetivos de promover o uso racional dos recursos naturais e a ocupação sustentável do território. A responsabilidade pela efetividade da norma, portanto, recai prioritariamente sobre o poder público, que deve atuar como garantidor do equilíbrio entre conservação ambiental e desenvolvimento econômico sustentável.
[1] CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Conama publica resolução sobre a padronização da emissão de autorizações de supressão de vegetação. 10 set. 2025. Disponível em: <https://cnm.org.br/comunicacao/noticias/conama-publica-resolucao-sobre-a-padronizacao-da-emissao-de-autorizacoes-de-supressao-de-vegetacao>. Acesso em: 16 set. 2025.
[2] CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Conama publica resolução sobre a padronização da emissão de autorizações de supressão de vegetação. 10 set. 2025. Disponível em: <https://cnm.org.br/comunicacao/noticias/conama-publica-resolucao-sobre-a-padronizacao-da-emissao-de-autorizacoes-de-supressao-de-vegetacao>. Acesso em: 16 set. 2025.
[3] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[4] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[5] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[6] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[7] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[8] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[9] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[10] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[11] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
[12] BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 510, de 15 de setembro de 2025. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-conama-n-510-de-15-de-setembro-de-2025-656033813>. Acesso em: 16 set. 2025.
OBS: Imagem extraída do site: <https://brazabe.com.br/os-beneficios-da-supressao-vegetal/>. Acesso em 16 de setembro de 2025.




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